quarta-feira, 22 de maio de 2019

Gongo Soco - Crônica * Agripa Vasconcelos- MG

GONGO SOCO: DE MAIOR MINA DE OURO DO MUNDO
 À BOMBA RELÓGIO IMINENTE


Como a imensa maioria das minas de ferro, em Minas Gerais, o Gongo Soco teve seu início como uma mina de ouro, a mais célebre de todas. O Gongo Soco foi a mina que mais produziu ouro em toda a história da humanidade. Inicialmente, o Gongo Soco foi de propriedade de João Batista de Sousa Coutinho, o Barão de Catas Altas, que, a partir de 1818, apurou somas fabulosas de ouro daquelas lavras a céu aberto. Durante dois anos, o Barão extraiu, por dia, nada menos do que 7 quilos e meio de ouro puro dos talhos abertos do Gongo Soco, o que fez de Catas Altas um dos homens mais ricos do Império Brasileiro e bancou todas as excentricidades pelas quais ficaria conhecido.

Posteriormente, julgando, esgotada a mina, Catas Altas a vendeu para os ingleses da Imperial Brazilian Mining Association, que passariam a empregar tecnologia mecanizada na exploração do ouro, como o trem de vagonetes e o engenho hidráulico de pilões, cujas cabeças dos trituradores eram produzidas pela Fábrica de Ferro de João Monlevade. Monlevade foi o fornecedor preferencial de artefatos de ferro das companhias mineradoras inglesas por mais de 50 anos, forjando não apenas as cabeças de ferro dos trituradores do quartzito aurífero, cada uma pesando 80 quilos, como também qualquer outra ferramenta demandada pela mineração, além de peças muito maiores. Há registro de peça de ferro de mais 900 quilos de peso fabricada por Monlevade e enviada até o Gongo Soco através de seus famosos carretões de quatro rodas, puxados por muitas juntas de bois. Mecanizado, constituído na forma de uma companhia e conformado aos moldes de uma vila européia, contanto com mais de 1.000 habitantes, de 1826 à 1856, o Gongo Soco produziu na mãos dos ingleses 27.887 quilos de ouro puro, algo sem precedente ou paralelo no mundo. Foram quase mil quilos de ouro por ano, mais de 2 quilos e meio de ouro por dia.

Minas como o Congo Soco foram importantíssimas, não apenas pela grande quantidade de ouro que produziram, mas principalmente pelo emprego intensivo da mecanização a que foram pioneiras, sendo consideradas hoje pela historiografia como o alvorecer da indústria mineira. Tais minas deixaram uma marca tão indelével na construção da identidade regional que ainda hoje a herança daqueles idos pode ser observada no jeito de falar do mineiro. Manter o processo de mecanização sempre funcionando não era tarefa fácil. O inglês estava sempre cobrando do mineiro o porquê da interrupção do funcionamento. Então o inglês indagava: “why (?)”, que é a tradução de “por que (?)”. Daí a origem da interjeição “uai”, tão utilizada pelo mineiro para exprimir surpresa ou espanto. “Sô”, que em Minas é utilizado como pronome de tratamento e “trem”, que é utilizado pelos mineiros como sinônimo de qualquer coisa, também são originários do convívio dos mineiros com os ingleses nas companhias mineradoras do ouro. “Trem” é referente ao “train” de vagonetes, sob trilhos, que eram empregados nas companhias mineradoras para extrair o minério aurífero das galerias subterrâneas; “sô” é a adaptação do vocábulo “sir”, que era como os ingleses eram tratados nas companhias.

Depois de extinta a Companhia Inglesa do Gongo Soco, a mina passou a ser explorada pela Vale também por seu minério de ferro que é puríssimo e, obviamente, muito rico em ouro. Outrora, um colosso aurífero, indutor do desenvolvimento da região, agora, o Gongo Soco se transformou numa verdadeira bomba-relógio que pode explodir a qualquer momento, mediante o risco da ruptura de mais uma barragem da mineração. É, terrivelmente, vergonhoso testemunhar como a mineração virou sinônimo de medo em Minas Gerais.


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